CINEMA MUDO
I
Um telegrama urgente
anuncia a bem amada
para o século vindouro.
Arfando diante do espelho
principio
a pentear os cabelos.
O oceano se banha nas próprias águas.
II
Acordei grávido e uma dúvida
dilacera minhas partes: quem seria a mãe
de meu filho?
Demônios graduados me visitam
enquanto retoco para a posteridade
a maquiagem do arco-íris.
III
Vejo seu retrato como seu eu
já tivesse morrido.
Grinaldas batem continência.
Livre na sua memória escolho a forma
que mais me convém: querubim
gaivotas blindadas
suave o tempo suspende a engrenagem.
Do outro lado do jardim já degusto
os inocentes grãos da demência.
IV
Neste retrato de noivado divulgamos
os nossos corpos solteiros.
Na hierarquia dos sexos, transparente,
escorrego
para o passado.
Na falta de quem nos olhe
vamos ficando perfeitos e belos
Tão belos e tão perfeitos
como a tarde quando pressente
as glândulas aéreas da noite.
Trago comigo um retrato
que me carrega com ele bem antes
de o possuir bem depois de o ter perdido.
Toda felicidade é memória e projeto.
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